sábado, 11 de outubro de 2008

A filosofia e a vida

Por mais que a filosofia seja uma disciplina abstrata, ela trata de realidades concretas, se detém em problemas que dizem respeito à vida, ao cotidiano do homem. Os filósofos, sobretudo, os gregos deram início ao filosofar na tentativa de entender o mundo e a realidade que os cercava.
Quando Aristóteles constrói seu sistema filosófico, não o faz por pura especulação ou divagação mental, mas sim para responder questões pertinentes à sociedade, à cultura e ao mundo da época.
Desta forma, também a abordagem que ele faz na Metafísica, capítulo X do livro lâmbda, é em busca de solução para um problema real, concreto e situado. Seguindo a idéia deste capítulo podemos dizer que a relação entre o conceito de substância e o conceito do bem e do mal está no fato de que tudo no universo tem o seu lugar, e de forma harmoniosa está ordenado para um único fim.
Cada coisa tem a sua própria natureza e o telos de cada uma é viver segundo esta natureza. Então qual seria a natureza do homem? Qual seria o seu telos? O homem é, por natureza, um animal racional e político, ele tem de viver segundo esta natureza, ou seja, se é um animal político tem de viver na pólis, em comunidade e não isolado; e sendo um animal racional deve fazer uso da razão.
Para que o homem possa viver na pólis, ou em sociedade, ele necessita de um sistema que estabeleça uma relação, a mais harmoniosa possível, com vistas a favorecer o bem viver. O sistema que vai estabelecer esta relação é o sistema político. Em outras palavras, o sistema político tem por finalidade estabelecer as normas que levam o homem a viver bem na cidade ocupando-se das coisas da cidade e vivendo em harmonia com seus concidadãos.
As normas que devem conduzir o homem ao bem viver, são criadas e acompanhadas pela ética e tem como intuito principal favorecer o bem e afastar o mal. E aqui entendemos o bem como o viver harmonioso, cada qual segundo a sua natureza e o mal, o seu contrário, o caos. Percebe-se claramente porque ética e política não se separavam nesta época.
Assim, podemos entender substância como sendo o quid, o substrato de cada coisa, a sua natureza, aquilo para a qual ela foi feita, aquilo para a qual ela existe, a sua finalidade. Cada ser tem sua substância, tem sua natureza, seu telos. E todos devem desempenhá-la de forma harmônica. A natureza do ser humano é viver em sociedade, fazendo uso da razão com vistas ao bem individual e coletivo. Procurar entender o mundo e transformá-lo num mundo cada vez melhor está implícito na condição racional de cada ser humano. A razão é inquieta e procura as causas últimas. É neste sentido que a filosofia se faz a ferramenta mais eficaz para o ser humano que procura viver em profundidade.

Viver ou existir?

O universo lingüístico é muito amplo e habitualmente requer que especifiquemos nossos conceitos. Por esta razão quero esclarecer em que sentido diferenciamos os conceitos “vida” e “existência”. Vida é um conceito amplo que contempla todos os seres-vivos como já transparece na própria nomenclatura. Neste sentido o homem é possuidor de vida tanto quanto qualquer outra espécie. O mesmo já não ocorre com o conceito de “existência”, ao menos no sentido que iremos empregá-lo doravante. Existir significa projetar a vida, significa ser o artífice dos seus próprios atos, planejá-los e executá-los com fins pré-determinados. Existir é bem mais do que simplesmente viver, é dar um sentido à própria vida, é não ser objeto da vida, mas sujeito ativo de sua autoconstrução tomando o destino nas mãos e dando-lhe rumo.
Este processo requer domínio de si e acima de tudo requer autonomia da vontade e autonomia racional. Um sujeito que vive sob estruturas de dominação está condenado a viver sem jamais existir. Torna-se instrumento de um sistema que pensa-o como objeto destinado a produzir e gerar riquezas para os detentores dos meios de produção ou então como ávido consumidor de mercadorias, em sua grande maioria supérfluas, produzidas tão somente com o intuito de inflacionar as altas cifras da classe dominante, como se a vida humana valesse menos que o saldo bancário. Satisfazer as necessidades básicas é um privilégio, porém o sistema cria a todo instante, e de forma muito sutil, novas “necessidades básicas”, levando o homem a não satisfazer-se jamais.
Na raiz desta relação está o trabalho. O homem se realiza em seu trabalho na medida em que este é reflexo de si mesmo e também possibilidade de fazer parte deste mundo de consumismo rumo a comodidades cada vez mais atraentes. O homem sem trabalho é um homem sem identidade, sem perspectivas, aquém dos demais, condenado à marginalidade da sociedade, pois, é com o fruto do seu trabalho que o homem consegue satisfazer suas necessidades e conquistar o seu espaço. Para o trabalhador o seu trabalho é fonte de sobrevivência e possibilidade de progresso, enquanto para o patrão fonte de enriquecimento. Pelo trabalho o homem deveria conquistar sua liberdade, mas a estrutura vigente sufoca esta liberdade transformando-o num objeto dentro de uma estrutura de competitividade onde o outro passou de aliado à ameaça.
Desta forma, poderíamos afirmar que no trabalho há a possibilidade de uma dupla dimensão: o homem pode se auto-realizar - na medida em que exterioriza o seu eu, como também pode se escravizar - na medida em que é transformado em objeto, instrumento e não consegue transcender esta relação. Dito de outra forma, por um lado, se faz necessário que o homem se encontre e se identifique com sua atividade e que fortaleça este aspecto de forma a sufocar cada vez mais o aspecto que o aliena de sua auto-transcendência manifesta nas suas obras; e por outro lado é preciso que o homem resista a toda forma de opressão imposta pelo trabalho sem, contudo, tornar-se vítima de sua resistência se marginalizando do mercado de trabalho.
Para que isto possa ocorrer é necessário que haja consciência desta dupla dimensão, conhecimento de sua estrutura de funcionamento, intenção de superação desta estrutura e, ousaríamos afirmar, que haja resignação por parte da classe trabalhadora como um todo, pois só assim seriam abaladas as estruturas injustas desta sociedade que nos é apresentada.
Dentre as muitas necessidades apresentadas ao homem, salientamos uma delas: a necessidade de o homem ser dono de si. O homem que não pensa e não age por si, não pode ser livre e feliz. Nem mesmo poderia ser chamado de homem em sentido restrito, pois, se entendermos o homem tão somente como um animal racional, não poderíamos afirmar que um ser que não reflete por si, seja homem. Este pensamento pode parecer radical, mas tem seu espaço dentro da lógica da instrumentalização do homem. Contudo, o homem tem outra esfera que não pode ser jamais esquecida que é a esfera dos sentimentos, da emoção, da sensibilidade, da afetividade. E, acredito que esta esfera sofre ainda muito mais os impactos do mundo do trabalho, pois o homem sente-se diminuído por sua luta inglória de conquistas no mundo do trabalho quando não consegue o desempenho, muitas vezes mirabolante, propostos pelo mercado de trabalho. Sente-se incapaz, mesquinho, inútil, pois o mercado consegue disseminar a idéia que o mundo pode ser conquistado pelos mais aptos. Isto significa dizer que as estruturas injustas são postas como fluxo normal do mercado de trabalho e que se houver alguma falha, esta não é do modelo apresentado, mas do indivíduo que a ela não consegue responder, não consegue se adaptar.
Como transpor esta barreira? Estudando o sistema e vendo-o como “um” sistema tão somente e não como “o” sistema; interando-se da evolução do mundo do trabalho e salientando nele o seu aspecto libertador e não o aspecto opressor; fortalecendo as relações no mundo do trabalho a fim de superar o individualismo e a indiferença entre as classes trabalhadoras e, por fim, dando ao trabalho um significado digno de quem tem nas mãos as rédeas da vida e transforma sua vida em existência e não apenas em sobrevivência.

O homem é bom ou mal, por natureza?

Todos nós queremos viver conforme pensamos, mas não pensamos conforme queremos. Nossos pensamentos trazem consigo uma infinidade de influências e são frutos de muitas situações que chegam até nós sem o nosso prévio consentimento. Trazemos a carga genética de nossa hereditariedade, trazemos influências da gestação de nossa mãe, trazemos traços do ambiente onde crescemos e da maneira que fomos educados (ou domesticados), trazemos resquícios da personalidade e do “jeitão” de nossos pais, irmãos, tios, vizinhos, colegas de estudo e de trabalho, trazemos influências dos meios de comunicação, das idéias que a sociedade define como valiosas, enfim vivemos da maneira que os outros querem que vivamos (lembre-se do Mito da Caverna, livro VII, da República de Platão) e achamos que estamos vivendo de acordo com nossos pensamentos, acreditando ter autonomia sobre nossa vida, pensamentos e ações. Ortega y Gasset nos diz que o homem é ele e suas circunstâncias e Schopenhauer nos diz que o homem pode fazer o que quer, mas não pode querer o que quer.
Outro dado relevante, para o assunto em questão é a consistência de nossos pensamentos. Quantas vezes ouvindo um político de um partido qualquer acabamos concordando com seu discurso, mais tarde ouvindo outro de um partido adversário também damos razão a este último. Quantos de nós, ao termos os primeiros contatos com filosofia e aprendermos algo de Platão concordamos com ele numa série de pontos, mais adiante conhecendo Aristóteles acabamos concordando com Aristóteles nos mesmos pontos que ele discordava de Platão. E isto se repete com racionalismo e empirismo, assim como vemos coerência nos conceitos de Descartes e mais adiante concordamos com Kant e depois com Hegel e por fim pensamos: como posso concordar com todos se eles discordam entre si? Outras vezes nos vemos discordando de tudo, da ciência, da religião, dos meios de comunicação, de nossos amigos e, há até, algumas vezes, discordando de nós mesmos e nos perguntando: como fui agir desta maneira, nem eu me entendo?
Com isto podemos dizer que a questão da antropologia natural, que de um lado vê a maldade implícita na natureza humana e de outro lado a vê como sendo boa, têm, ambas, as suas razões e se torna difícil estabelecer um parâmetro de referência que possibilite uma análise o mais imparcial possível.
Faz-se necessário levar em conta, antes de qualquer coisa, a história pessoal de cada pensador, que defende uma ou outra posição, bem como o contexto, a realidade de ambos. Certa vez um professor afirmou que pensamos com as nádegas e após nossas gargalhadas ele retomou sério o seu discurso e esclareceu: quando sento na cadeira do diretor, penso como diretor; ao sentar-se na cadeira do empregado, penso como o empregado. Certamente nenhum dos pensadores tomou a posição que tomou sem ter sofrido influências externas e com certeza cada um tinha em mente homens (ou naturezas concretas, através das quais chegaram a idéia universal) diferentes, os quais serviram de protótipos para suas análises.
Vejamos Hobbes. Para ele, a primeira lei natural do homem é a da autopreservação, que o induz a impor-se sobre os demais; por isso, a vida seria uma "guerra de todos contra todos", na qual "o homem é o lobo do homem".
De outro lado vemos John Locke, o qual nasceu numa família anglicana de tendências puritanas, estudou humanidades, interessou-se pelas ciências da natureza e pela medicina. Locke usufruiu todo tipo de honraria e consideração, o que lhe permitiu dedicar-se à publicação de suas obras.
A aceitação que um e outro tiveram pela sociedade da época foi diferente e, portanto, é de se esperar uma diferença entre a maneira de cada um deles compreender a realidade, assim como aconteceu com Hume, Montesquieu, Rousseau, e outros.
Se optar por uma determinada concepção, logicamente sou levado a isto pela maneira que concebo o mundo. Porém, tendo de viver conforme penso, ou seja, construir minha autonomia, vejo a natureza boa do homem como sendo a que mais corresponde à ordem natural do mundo. Todas as criaturas têm em si um telos, uma finalidade. A própria natureza vegetal e animal busca desempenhar esta finalidade da melhor forma possível, caminhando para a perfeição e a perfeita harmonia. Sendo o homem, o animal mais desenvolvido, mais capaz, o único que se privilegia da razão, porque teria ele, e somente ele, de fugir desta ordem natural estabelecida no mundo? Tudo evolui para um sentido bom, todas as coisas procuram a preservação da vida e da espécie, somente o homem já traria consigo uma ordem má? E se o homem buscasse o mal, não procuraria o mal para si, mas para o outro e somente procuraria este mal, pensando no bem dele, então o homem não seria de todo mal, ele seria bom para consigo mesmo.
A maior prova que o homem nasce bom está no homem quando nasce. Ele é incapaz de fazer o mal. É na convivência com os maus que, muitas vezes, se acaba assimilando aquele comportamento. Porém, aqui vale observar, que nem sempre o convívio com os maus corrompe os bons. Temos vários exemplos de homens que foram vítimas do mal e conseguiram superar isto de uma forma sublime. Se o mal persiste deve-se ao comodismo dos bons (Leão XIII).
Apesar de parecer que trato de um tema geral abordando comportamentos individuais, no fundo o que quero resgatar é a natureza concreta do ser humano. Poderíamos, seguindo a linguagem tecnológica e industrial, afirmar que se alguém é mau, é por um “defeito de fábrica” e não de uma “característica do produto”.
Sendo que o homem é ele e suas circunstâncias (Ortega y Gasset), ele poderá ser conduzido a viver como lobo ou como anjo, uma vez que não se pode querer o que se quer. Mas, acredito que o bem sempre há de prevalecer, pois assim como a treva some quando a luz se faz presente, o mau some quando o bom prevalece.

Eros e Psique

(Este mito encontra-se no livro Asno de Ouro, de Lucius Apuleio, escrito no século II d.C.)

Psique era a mais nova de três filhas de um rei de Mileto e era extremamente bela. Sua beleza era tanta que pessoas de várias regiões iam admirá-la, assombrados, rendendo-lhe homenagens que só eram devidas à própria Afrodite.
Profundamente ofendida e enciumada, Afrodite enviou seu filho, Eros, para fazê-la apaixonar-se pelo homem mais feio e vil de toda a terra. Porém, ao ver sua beleza, Eros apaixonou-se profundamente.
O pai de Psique, suspeitando que, inadvertidamente, havia ofendido os deuses, resolveu consultar o oráculo de Apolo, pois suas outras filhas encontraram maridos e, no entanto, Psique permanecia sozinha. Através desse oráculo, o próprio Eros ordenou ao rei que enviasse sua filha ao topo de uma solitária montanha, onde seria desposada por uma terrível serpente. A jovem aterrorizada foi levada ao pé do monte e abandonada por seu pesarosos parentes e amigos. Conformada com seu destino, Psique foi tomada por um profundo sono, sendo, então, conduzida pela brisa gentil de Zéfiro a um lindo vale.
Quando acordou, caminhou por entre as flores, até chegar a um castelo magnífico. Notou que lá deveria ser a morada de um deus, tal a perfeição que podia ver em cada um dos seus detalhes. Tomando coragem, entrou no deslumbrante palácio, onde todos os seus desejos foram satisfeitos por ajudantes invisíveis, dos quais só podia ouvir a voz.
Chegando a escuridão, foi conduzida pelos criados a um quarto de dormir. Certa de ali encontraria finalmente o seu terrível esposo, começou a tremer quando sentiu que alguém entrara no quarto. No entanto, uma voz maravilhosa a acalmou. Logo em seguida, sentiu mãos humanas acariciarem seu corpo. A esse amante misterioso, ela se entregou.. Quando acordou, já havia chegado o dia e seu amante havia desaparecido. Porém essa mesma cena se repetiu por diversas noites.
Enquanto isso, suas irmãs continuavam a sua procura, mas seu esposo misterioso a alertou para não responder aos seus chamados. Psique sentindo-se solitária em seu castelo-prisão, implorava ao seu amante para deixá-la ver suas irmãs. Finalmente, ele aceitou, mas impôs a condição que, não importando o que suas irmãs dissessem, ela nunca tentaria conhecer sua verdadeira identidade.
Quando suas irmãs entraram no castelo e viram aquela abundância de beleza e maravilhas, foram tomadas de inveja. Notando que o esposo de Psique nunca aparecia, perguntaram maliciosamente sobre sua identidade. Embora advertida por seu esposo, Psique viu a dúvida e a curiosidade tomarem conta de seu ser, aguçadas pelos comentários de suas irmãs.
Seu esposo alertou-a que suas irmãs estavam tentando fazer com que ela olhasse seu rosto, mas se assim ela fizesse, ela nunca mais o veria novamente. Além disso, ele contou-lhe que ela estava grávida e se ela conseguisse manter o segredo ele seria divino, porém se ela falhasse, ele seria mortal.
Ao receber novamente suas irmãs, Psique contou-lhes que estava grávida, e que sua criança seria de origem divina. Suas irmãs ficaram ainda mais enciumadas com sua situação, pois além de todas aquelas riquezas, ela era a esposa de um lindo deus. Assim, trataram de convencer a jovem a olhar a identidade do esposo, pois se ele estava escondendo seu rosto era porque havia algo de errado com ele. Ele realmente deveria ser uma horrível serpente e não um deus maravilhoso.
Assustada com o que suas irmãs disseram, escondeu uma faca e uma lâmpada próximo a sua cama, decidida a conhecer a identidade de seu marido, e se ele fosse realmente um monstro terrível, matá-lo. Ela havia esquecido dos avisos de seu amante, de não dar ouvidos a suas irmãs.
A noite, quando Eros descansava ao seu lado, Psique tomou coragem e aproximou a lâmpada do rosto de seu marido, esperando ver uma horrenda criatura. Para sua surpresa, o que viu porém deixou-a maravilhada. Um jovem de extrema beleza estava repousando com tamanha quietude e doçura que ela pensou em tirar a própria vida por haver dele duvidado.Enfeitiçada por sua beleza, demorou-se admirando o deus alado. Não percebeu que havia inclinado de tal maneira a lâmpada que uma gota de óleo quente caiu sobre o ombro direito de Eros, acordando-o.
Eros olhou-a assustado, e voou pela janela do quarto, dizendo: "Tola Psique! É assim que retribuis meu amor? Depois de haver desobedecido as ordens de minha mãe e te tornado minha esposa, tu me julgavas um monstro e estavas disposta a cortar minha cabeça? Vai. Volta para junto de tuas irmãs, cujos conselhos pareces preferir aos meus. Não lhe imponho outro castigo, além de deixar-te para sempre. O amor não pode conviver com a suspeita."
Quando se recompôs, notou que o lindo castelo a sua volta desaparecera, e que se encontrava bem próxima da casa de seus pais. Psique ficou inconsolável. Tentou suicidar-se atirando-se em um rio próximo, mas suas águas a trouxeram gentilmente para sua margem. Foi então alertada por Pan para esquecer o que se passou e procurar novamente ganhar o amor de Eros.
Por sua vez, quando suas irmãs souberam do acontecido, fingiram pesar, mas partiram então para o topo da montanha, pensando em conquistar o amor de Eros. Lá chegando, chamaram o vento Zéfiro, para que as sustentasse no ar e as levasse até Eros. Mas, Zéfiro desta vez não as ergueram no céu, e elas caíram no despenhadeiro, morrendo.
Psique, resolvida a reconquistar a confiança de Eros, saiu a sua procura por todos os lugares da terra, dia e noite, até que chegou a um templo no alto de uma montanha. Com esperança de lá encontrar o amado, entrou no templo e viu uma grande bagunça de grãos de trigo e cevada, ancinhos e foices espalhados por todo o recinto. Convencida que não devia negligenciar o culto a nenhuma divindade, pôs-se a arrumar aquela desordem, colocando cada coisa em seu lugar. Deméter, para quem aquele templo era destinado, ficou profundamente grata e disse-lhe:
- "Ó Psique, embora não possa livrá-la da ira de Afrodite, posso ensiná-la a fazê-lo com suas próprias forças: vá ao seu templo e renda a ela as homenagens que ela, como deusa, merece."
Afrodite, ao recebê-la em seu templo, não esconde sua raiva. Afinal, por aquela reles mortal seu filho havia desobedecido suas ordens e agora ele se encontrava em um leito, recuperando-se da ferida por ela causada. Como condição para o seu perdão, a deusa impôs uma série de tarefas que deveria realizar, tarefas tão difíceis que poderiam causar sua morte.
Primeiramente, deveria, antes do anoitecer, separar uma grande quantidade de grãos misturados de trigo, aveia, cevada, feijões e lentilhas. Psique ficou assustada diante de tanto trabalho, porém uma formiga que estava próxima, ficou comovida com a tristeza da jovem e convocou seu exército a isolar cada uma das qualidades de grão.Como 2ª tarefa, Afrodite ordenou que fosse até as margens de um rio onde ovelhas de lã dourada pastavam e trouxesse um pouco da lã de cada carneiro. Psique estava disposta a cruzar o rio quando ouviu um junco dizer que não atravessasse as águas do rio até que os carneiros se pusessem a descansar sob o sol quente, quando ela poderia aproveitar e cortar sua lã. De outro modo, seria atacada e morta pelos carneiros. Assim feito, Psique esperou até o sol ficar bem alto no horizonte, atravessou o rio e levou a Afrodite uma grande quantidade de lã dourada.
Sua 3ª tarefa seria subir ao topo de uma alta montanha e trazer para Afrodite uma jarra cheia com um pouco da água escura que jorrava de seu cume. Dentre os perigos que Psique enfrentou, estava um dragão que guardava a fonte. Ela foi ajudada nessa tarefa por uma grande águia, que voou baixo próximo a fonte e encheu a jarra com a negra água.
Irada com o sucesso da jovem, Afrodite planejou uma última, porém fatal, tarefa. Psique deveria descer ao mundo inferior e pedir a Perséfone, que lhe desse um pouco de sua própria beleza, que deveria guardar em uma caixa. Desesperada, subiu ao topo de uma elevada torre e quis atirar-se, para assim poder alcançar o mundo subterrâneo. A torre porém murmurou instruções de como entrar em uma particular caverna para alcançar o reino de Hades. Ensinou-lhe ainda como driblar os diversos perigos da jornada, como passar pelo cão Cérbero e deu-lhe uma moeda para pagar a Caronte pela travessia do rio Estige, advertindo-a:
- "Quando Perséfone lhe der a caixa com sua beleza, toma o cuidado, maior que todas as outras coisas, de não olhar dentro da caixa, pois a beleza dos deuses não cabe a olhos mortais."
Seguindo essas palavras, conseguiu chegar até Perséfone, que estava sentada imponente em seu trono e recebeu dela a caixa com o precioso tesouro. Tomada porém pela curiosidade em seu retorno, abriu a caixa para espiar. Ao invés de beleza havia apenas um sono terrível que dela se apossou.
Eros, curado de sua ferida, voou ao socorro de Psique e conseguiu colocar o sono novamente na caixa, salvando-a. Lembrou-lhe novamente que sua curiosidade havia novamente sido sua grande falta, mas que agora podia apresentar-se à Afrodite e cumprir a tarefa. Enquanto isso, Eros foi ao encontro de Zeus e implorou a ele que apaziguasse a ira de Afrodite e ratificasse o seu casamento com Psique. Atendendo seu pedido, o grande deus do Olimpo ordenou que Hermes conduzisse a jovem à assembléia dos deuses e a ela foi oferecida uma taça de ambrosia. Então com toda a cerimônia, Eros casou-se com Psique, e no devido tempo nasceu seu filho, chamado Voluptas (Prazer).

Fonte: http://www.angelfire.com/la/psique/mito.html

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Sugestões de vídeos

1 - O que é filosofia, com Paulo Ghiraldelli Jr.
http://br.youtube.com/watch?v=fGxrFw9RBQk

2 – O mito da caverna
http://br.youtube.com/watch?v=dpaNMe47Vog

3 – O mito da caverna hoje
http://br.youtube.com/watch?v=WkWQ6jB3jm0

4 - Para que serve a filosofia
http://br.youtube.com/watch?v=W6LjvmzIb7I

5 – Futebol dos filósofos (comédia do grupo inglês Monty Phyton)
http://br.youtube.com/watch?v=moWZm66J_yM

O Mito da Caverna

Extraído de "A República" de Platão . 6° ed. Ed. Atena, 1956, p. 287-291
SÓCRATES – Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só vêem os objetos que lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto. Atrás deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os cativos imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro parecido com os tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultar-lhes as molas dos bonecos maravilhosos que lhes exibem.
GLAUCO - Imagino tudo isso.
SÓCRATES - Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com figuras e objetos que se
elevam acima dele, figuras de homens e animais de toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio.
GLAUCO - Similar quadro e não menos singulares cativos!
SÓCRATES - Pois são nossa imagem perfeita. Mas, dize-me: assim colocados, poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas, à claridade do fogo, na parede que lhes fica fronteira?
GLAUCO - Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante toda a vida.
SÓCRATES - E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra coisa que não as sombras?
GLAUCO - Não.
SÓCRATES - Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que, ao falar das sombras que vêem, lhes dariam os nomes que elas representam?
GLAUCO - Sem dúvida.
SÓRATES - E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse as palavras dos que passam, não julgariam certo que os sons fossem articulados pelas sombras dos objetos?
GLAUCO - Claro que sim.
SÓCRATES - Em suma, não creriam que houvesse nada de real e verdadeiro fora das figuras que desfilaram.
GLAUCO - Necessariamente.
SÓCRATES - Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo das cadeias e do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos desatado, obrigado a levantar-se de repente, a volver a cabeça, a andar, a olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer tudo isso sem grande pena; a luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de discernir os objetos cuja sombra antes via.
Que te parece agora que ele responderia a quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe desfilavam ante os olhos, o obrigasse a dizer o
que eram. Não te parece que, na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real e verdadeiro que os objetos ora contemplados?
GLAUCO - Sem dúvida nenhuma.
SÓCRATES - Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para as sombras que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais visíveis que os objetos ora mostrados?
GLAUCO - Certamente.
SÓCRATES - Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho áspero e escarpado, para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do sol, não é de crer que daria gritos lamentosos e brados de cólera? Chegando à luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor ambiente, ser-lhe ia possível discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem reais?
GLAUCO - A princípio nada veria.
SÓCRATES - Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da região superior. Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as imagens dos homens e outros seres refletidos nas águas; finalmente erguendo os olhos para a lua e as estrelas, contemplaria mais facilmente os astros da noite que o pleno resplendor do dia.
GLAUCO - Não há dúvida.
SÓCRATES - Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o próprio sol, primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si mesmo e no seu próprio lugar, tal qual é.
GLAUCO - Fora de dúvida.
SÓCRATES - Refletindo depois sobre a natureza deste astro, compreenderia que é o que produz as estações e o ano, o que tudo governa no mundo visível e, de certo modo, a causa de tudo o que ele e seus companheiros viam na caverna.
GLAUCO - É claro que gradualmente chegaria a todas essas conclusões.
SÓCRATES - Recordando-se então de sua primeira morada, de seus companheiros de escravidão e da idéia que lá se tinha da sabedoria, não se daria os parabéns pela mudança sofrida, lamentando ao mesmo tempo a sorte dos que lá ficaram?
GLAUCO - Evidentemente.
SÓCRATES - Se na caverna houvesse elogios, honras e recompensas para quem melhor e mais prontamente distinguisse a sombra dos objetos, que se recordasse com mais precisão dos que precediam, seguiam ou marchavam juntos, sendo, por isso mesmo, o mais hábil em lhes predizer a aparição, cuidas que o homem de que falamos tivesse inveja dos que no cativeiro eram os mais poderosos e honrados? Não preferiria mil vezes, como o herói de Homero, levar a vida de um pobre lavrador e sofrer tudo no mundo a voltar às primeiras ilusões e viver a vida que antes vivia?
GLAUCO - Não há dúvida de que suportaria toda a espécie de sofrimentos de preferência a viver da maneira antiga.
SÓCRATES - Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso homem volte ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como submersos em trevas?
GLAUCO - Certamente.
SÓCRATES - Se, enquanto tivesse a vista confusa -- porque bastante tempo se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à obscuridade -- tivesse ele de dar opinião sobre as sombras e a este respeito entrasse em discussão com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo que os faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara, que não valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles o mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto?
GLAUCO - Por certo que o fariam.
SÓCRATES - Pois agora, meu caro GLAUCO, é só aplicar com toda a exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito. O antro subterrâneo é o mundo visível. O fogo que o ilumina é a luz do sol. O cativo que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível. Ou, antes, já que
o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos.

Conflito de gerações

Falando sobre conflitos de gerações, o médico inglês Ronald Gibson começou uma conferência citando quatro frases:
1) Nossa juventude adora o luxo, é mal-educada, caçoa da autoridade e não tem o menor respeito pelos mais velhos. Nossos filhos hoje são verdadeiros tiranos. Eles não se levantam quando uma pessoa idosa entra, respondem a seus pais e são simplesmente maus.
2) Não tenho mais nenhuma esperança no futuro do nosso país se a juventude de hoje tomar o poder amanhã, porque essa juventude é insuportável, desenfreada, simplesmente horrível.
3) Nosso mundo atingiu seu ponto crítico. Os filhos não ouvem mais seus pais. O fim do mundo não pode estar muito longe.
4) Essa juventude está estragada até o fundo do coração. Os jovens são malfeitores e preguiçosos. Eles jamais serão como a juventude de antigamente. A juventude de hoje não será capaz de manter a nossa cultura.
Após ter lido as quatro citações, ficou muito satisfeito com a aprovação que os espectadores davam às frases. Então, revelou a origem delas:
- A primeira é de Sócrates (470-399 a.C.);
- A segunda é de Hesíodo (720 a.C.);
- A terceira é de um sacerdote do ano 2000 a.C.; E a quarta estava escrita em um vaso de argila descoberto nas ruínas da Babilônia (Atual Bagdá) e tem mais de 4000 anos de existência.

A carta do cacique Seattle

Em 1855, o cacique Seattle, da tribo Suquamish, do Estado de Washington, enviou esta carta ao presidente dos Estados Unidos (Francis Pierce), depois de o Governo haver dado a entender que pretendia comprar o território ocupado por aqueles índios. Faz já mais de cento e cinquenta anos. Mas o desabafo do cacique tem uma incrível atualidade. A carta:
"Como podeis comprar ou vender o céu, a tepidez do chão? A idéia não tem sentido para nós. Se não possuímos o frescor do ar ou o brilho da água, como podeis querer comprá-los? Qualquer parte desta terra é sagrada para meu povo. Qualquer folha de pinheiro, qualquer praia, a neblina dos bosques sombrios, o brilhante e zumbidor inseto, tudo é sagrado na memória e na experiência de meu povo. A seiva que percorre o interior das árvores leva em si as memórias do homem vermelho.
Os mortos do homem branco esquecem a terra de seu nascimento, quando vão pervagar entre as estrelas. Nossos mortos jamais esquecem esta terra maravilhosa, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela é parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs, os gamos, os cavalos a majestosa águia, todos nossos irmãos. Os picos rochosos, a fragrância dos bosques, a energia vital do pônei e do homem, tudo pertence a uma só família.
Assim, quando o grande chefe em Washington manda dizer que deseja comprar nossas terras, ele está pedindo muito de nós. O grande Chefe manda dizer que nos reservará um sítio onde possamos viver confortavelmente por nós mesmos. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Se é assim, vamos considerar a sua proposta sobre a compra de nossa terra. Mas tal compra não será fácil, já que esta terra é sagrada para nós.
A límpida água que percorre os regatos e rios não é apenas água, mas o sangue de nossos ancestrais. Se vos vendermos a terra, tereis de lembrar a nossos filhos que ela é sagrada, e que qualquer reflexo espectral sobre a superfície dos lagos evoca eventos e fases da vida do meu povo. O marulhar das águas é a voz dos nossos ancestrais.
Os rios são nossos irmãos, eles nos saciam a sede. Levam as nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se vendermos nossa terra a vós, deveis vos lembrar e ensinar a nossas crianças que os rios são nossos irmãos, vossos irmãos também, e deveis a partir de então dispensar aos rios a mesma espécie de afeição que dispensais a um irmão.
Nós mesmos sabemos que o homem branco não entende nosso modo de ser. Para ele um pedaço de terra não se distingue de outro qualquer, pois é um estranho que vem de noite e rouba da terra tudo de que precisa. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, depois que a submete a si, que a conquista, ele vai embora, à procura de outro lugar. Deixa atrás de si a sepultura de seus pais e não se importa. A cova de seus pais é a herança de seus filhos, ele os esquece. Trata a sua mãe, a terra, e seus irmãos, o céu como coisas a serrem comprados ou roubados, como se fossem peles de carneiro ou brilhantes contas sem valor. Seu apetite vai exaurir a terra, deixando atrás de si só desertos. Isso eu não compreendo. Nosso modo de ser é completamente diferente do vosso. A visão de vossas cidades faz doer aos olhos do homem vermelho.
Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e como tal, nada possa compreender. Nas cidades do homem branco não há um só lugar onde haja silêncio, paz. Um só lugar onde ouvir o farfalhar das folhas na primavera, o zunir das asas de um inseto. Talvez seja porque sou um selvagem e não possa compreender.
O barulho serve apenas para insultar os ouvidos. E que vida é essa onde o homem não pode ouvir o pio solitário da coruja ou o coaxar das rãs à margem dos charcos à noite? O índio prefere o suave sussurrar do vento esfrolando a superfície das águas do lago, ou a fragrância da brisa, purificada pela chuva do meio-dia ou aromatizada pelo perfume dos pinhos.
O ar é precioso para o homem vermelho, pois dele todos se alimentam. Os animais, as árvores, o homem, todos respiram o mesmo ar. O homem branco parece não se importar com o ar que respira. Como um cadáver em decomposição, ele é insensível ao mau cheiro. Mas se vos vendermos nossa terra, deveis vos lembrar que o ar é precioso para nós, que o ar insufla seu espírito em todas as coisas que dele vivem. O ar que vossos avós inspiraram ao primeiro vagido foi o mesmo que lhes recebeu o último suspiro.
Se vendermos nossa terra a vós, deveis conservá-la à parte, como sagrada, como um lugar onde mesmo um homem branco possa ir sorver a brisa aromatizada pelas flores dos bosques.
Assim consideraremos vossa proposta de comprar nossa terra. Se nos decidirmos a aceitá-la, farei uma condição: O homem branco terá que tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos.
Sou um selvagem e não compreendo de outro modo. Tenho visto milhares de búfalos a apodrecerem nas pradarias, deixados pelo homem branco que neles atira de um trem em movimento.
Sou um selvagem e não compreendo como o fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante que o búfalo, que nós caçamos apenas para nos mantermos vivos.
Que será dos homens sem os animais? Se todos os animais desaparecem, o homem morreria de solidão espiritual. Porque tudo isso pode cada vez mais afetar os homens. Tudo está encaminhado.
Deveis ensinar a vossos filhos que o chão onde pisam simboliza a as cinzas de nossos ancestrais. Para que eles respeitem a terra, ensinai a eles que ela é rica pela vida dos seres de todas as espécies. Ensinai a eles o que ensinamos aos nossos: Que a terra é a nossa mãe. Quando o homem cospe sobre a terra, está cuspindo sobre si mesmo. De uma coisa nós temos certeza: A terra não pertence ao homem branco; O homem branco é que pertence à terra. Disso nós temos certeza. Todas as coisas estão relacionadas como o sangue que une uma família. Tudo está associado. O que fere a terra fere também aos filhos da terra.
O homem não tece a teia da vida: É antes um dos seus fios. O que quer que faça a essa teia, faz a si próprio. Mesmo o homem branco, a quem Deus acompanha e com quem conversa como um amigo, não pode fugir a esse destino comum. Talvez, apesar de tudo, sejamos todos irmãos.
Nós o veremos. De uma coisa sabemos, é que talvez o homem branco venha a descobrir um dia: Nosso Deus é o mesmo deus. Podeis pensar hoje que somente vós o possuis, como desejais possuir a terra, mas não podeis. Ele é o Deus do homem e sua compaixão é igual tanto para o homem branco, quanto para o homem vermelho.
Esta terra é querida dele, e ofender a terra é insultar o seu criador. Os brancos também passarão talvez mais cedo do que todas as outras tribos. Contaminai a vossa cama, e vos sufocareis numa noite no meio de vossos próprios excrementos. Mas no nosso parecer, brilhareis alto, iluminado pela força do Deus que vos trouxe a esta terra e por algum favor especial vos outorgou domínio sobre ela e sobre o homem vermelho. Este destino é um mistério para nós, pois não compreendemos como será no dia em que o último búfalo for dizimado, os cavalos selvagens domesticados, os secretos recantos das florestas invadidos pelo odor do suor de muitos homens e a visão das brilhantes colinas bloqueada por fios falantes.
Onde está o matagal? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu. O fim do viver e o início do sobreviver." Talvez compreendêssemos com que sonha o homem branco se soubéssemos quais as esperanças transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais visões do futuro oferecem para que possam ser formados os desejos do dia de amanhã. Mas nós somos selvagens. Os sonhos do homem branco são ocultos para nós. E por serem ocultos temos que escolher o nosso próprio caminho. Se consentirmos na venda é para garantir as reservas que nos prometeste. Lá talvez possamos viver os nossos últimos dias como desejamos. Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará a viver nestas florestas e praias, porque nós as amamos como um recém-nascido ama o bater do coração de sua mãe. Se te vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueça como era a terra quando dela tomou posse. E com toda a sua força, o seu poder, e todo o seu coração, conserva-a para os seus filhos, e ama-a como Deus nos ama a todos. Uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é querida por Ele. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum."

Uma história real de droga e sofrimento

Meu nome é Patrícia, tenho 17 anos, e encontro-me no, momento quase sem forças, mas pedi para a enfermeira Dane minha amiga para escrever esta carta que será endereçada aos jovens de todo o Brasil, antes que seja tarde demais. Eu era uma jovem "sarada", criada em uma excelente família de classe média alta Florianópolis. Meu pai é Engenheiro Eletrônico de uma grande estatal e procurou sempre para mim e para Meus dois irmãos dar tudo de bom e o que tem de melhor, inclusive liberdade que eu nunca soube aproveitar. Aos 13 anos participei e ganhei um concurso para modelo e manequim para a Agência Kasting e fui até o final do concurso que selecionou as novas Paquitas do programa da Xuxa. Fui também selecionada para fazer um Book na Agência Elite em São Paulo. Sempre me destaquei pela minha beleza física, chamava a atenção por onde passava. Estudava no melhor colégio de Floripa",Coração de Jesus. Tinha todos os garotos do colégio aos meus pés. Nos finais de semana freqüentava shopping, praias, cinema, curtia com minhas amigas tudo o que a vida tinha de melhor a oferecer às pessoas saradas,física e mentalmente.
Porém, como a vida nos prega algumas peças, o meu destino começou a mudar em outubro de 1994. Fui com uma turma de amigos para a OCTOBERFEST em Blumenau.Os meus pais confiavam em mim e me liberaram sem mais apego. Em Blumenau, achei tudo legal, fizemos um esquenta no "Bude", famoso barzinho da Rua XV.À noite fomos ao "PROEB" e no "Pavilhão Galego"tinha um show maneiro da Banda Cavalinho branco.Aquela movimentação de gente era trimaneira"". Eu já tinha experimentado algumas bebidas, tomava escondido da minha mãe o Licor Amarula, mas nunca tinha ficado bêbada. Na quinta feira, primeiro dia de OCTOBER, tomei o meu primeiro porre de CHOPP. Que sensação legal curti a noite inteira"doidona",beijei uns 10 carinhas, inclusive minhas amigas colocavam o CHOPP numa mamadeira misturado com guaraná para enganar os "meganha", porque menor não podia beber; mas a gente bebeu a noite inteira e os otários" não percebiam. Lá pelas 4h da manhã, fui levada ao Posto Médico, quase em coma alcoólico, numa maca dos Bombeiros. Deram-me umas injeções de glicose para melhorar.Quando fui ao apartamento quase "vomitei as tripas",mas o meu grito de liberdade estava dado. No dia seguinte aquela dor de cabeça horrível, um mal estar daqueles como tensão pré-menstrual. No sábado conhecemos uma galera de S. Paulo,que alugaram um "ap" no mesmo prédio. Nem imaginava que naquele dia eu estava sendo apresentada ao meu futuro assassino.
Bebi um pouco no sábado, a festa não estava legal, mas lá pelas 5:30 h da manhã fomos ao "ap" dos garotos para curtir o restante da noite. Rolou de tudo e fui apresentada ao famoso baseado "Cigarro de Maconha", que me ofereceram. No começo resisti, mas chamaram a gente de "Catarina careta", mexeram com nossos brios e acabamos experimentando. Fiquei com uma sensação esquisita, de baixo astral, mas no dia seguinte antes de ir embora experimentei novamente. O garoto mais velho da turma o "César", fazia carreirinho e cheirava um pó branco que descobri ser cocaína. Ofereceram-me, mas não tive coragem naquele dia.Retornamos a "Floripa" mas percebi que alguma coisa tinha mudado, eu sentia a necessidade de buscar novas experiências, e não demorou muito para eu novamente deparar-me com meu assassino "DROGAS". Aos poucos meus melhores amigos foram se afastando quando comecei a me envolver com uma galera da pesada, e sem perceber eu já era uma dependente química, a partir do momento que a droga começou a fazer parte do meu cotidiano. Fiz viagens alucinantes, fumei maconha misturada com esterco de cavalo, experimentei cocaína misturada com um monte de porcaria. Eu e a galera descobrimos que misturando cocaína com sangue o efeito dela ficava mais forte, e aos poucos não compartilhávamos a seringa e sim o sangue que cada um cedia para diluir o pó.
No início a minha mesada cobria os meus custos com as malditas, porque a galera repartia e o preço era acessível. Comecei a comprar a "branca" a R$ 7,00 o grama, mas não demorou muito para conseguir somente a R$ 15,00 a boa, e eu precisava no mínimo 5 doses diárias. Saía na sexta-feira e retornava aos domingos com meus "novos amigos". Às vezes a gente conseguia o "extasy", dançávamos nos "Points" a noite inteira e depois farra. O meu comportamento tinha mudado em casa, meus pais perceberam, mas no início eu disfarçava e dizia que eles não tinham nada a ver com a minha vida.
Comecei a roubar em casa pequenas coisas para vender ou trocar por drogas. Aos poucos o dinheiro foi faltando e para conseguir grana fazia programas com uns velhos que pagavam bem.Sentia nojo de vender o meu corpo, mas era necessário para conseguir dinheiro. Aos poucos toda a minha família foi se desestruturando. Fui internada diversas vezes em Clínicas de Recuperação.
Meus pais sempre com muito amor gastavam fortunas para tentar reverter o quadro. Quando eu saía da Clínica agüentava alguns dias, mas logo estava me picando novamente. Abandonei tudo: escola, bons amigos e família.
Em dezembro de 1997 a minha sentença de morte foi decretada; descobri que havia contraído o vírus da AIDS, não sei se me picando, ou através de relações sexuais muitas vezes sem camisinha. Devo ter passado o vírus a um montão de gente, porque os homens pagavam mais para transar sem camisinha.
Aos poucos os meus valores, que só agora reconheço, foram acabando, família, amigos, pais, religião, Deus, até Deus, tudo me parecia ridículo.Meu pai e minha mãe fizeram tudo, por isso nunca vou deixar de amá-los. Eles me deram o bem mais precioso que é a vida e eu a joguei pelo ralo.
Estou internada, com 24 kg, horrível, não quero receber visitas porque não podem me ver assim, não sei até quando sobrevivo, mas do fundo do coração peço aos jovens que não entrem nessa viagem maluca... Você com certeza vai se arrepender assim como eu, mas percebo que é tarde demais pra mim. OBS.: Patrícia encontrava-se internada no Hospital Universitário de Florianópolis e a enfermeira Danelise, que cuidava de Patrícia, veio a comunicar que Patrícia veio a falecer 14 horas mais tarde depois que escreveram essa carta, de parada cardíaca respiratória em conseqüência da AIDS.
Por favor, repassem esta carta. Este era o Último desejo de Patrícia.
POR FAVOR AMIGOS, PEÇO-LHES ENCARECIDAMENTE QUE ENVIEM ESSA CARTA A TODOS. SE ELA CHEGOU A SUA MÃO NÃO É POR ACASO! SIGNIFICA QUE VOCÊ FOI ESCOLHIDO PARA AJUDAR ALGUÉM!