Nos países ocidentais, o crescimento econômico é a principal medida do bem-estar de uma população. Mas existem países que consideram outros fatores, como a preservação da natureza e da cultura e a própria felicidade.
O Produto Interno Bruto (PIB) per capita e o
crescimento econômico são normalmente os indicadores utilizados para medir o
bem-estar e a qualidade de vida de um país. A suposição básica é que
crescimento significa riqueza, e quando a economia está bem todos ficam
satisfeitos.
No entanto, já há 40 anos o Clube de Roma,
organização que reúne especialistas internacionais para lidar com questões como
sustentabilidade, alertou em seu relatório Limites do crescimento que
uma economia baseada apenas na exploração de recursos naturais, acompanhada por
um aumento permanente da população mundial, leva à destruição dos fundamentos
da vida.
Em 1987 foi a vez de o conceito de sustentabilidade
aparecer pela primeira vez no debate internacional sobre desenvolvimento. O
relatório final da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
afirmava que um desenvolvimento só pode ser sustentável se "satisfazer as
necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de
suprir suas próprias necessidades".
O
presidente Evo Morales da Bolívia, país que insituia a política do "Buen
Vivir" em 2009
Desenvolvimento em harmonia com a natureza
O conceito de Buen Vivir, ou Viver Bem, que o
Equador e a Bolívia colocaram nas suas constituições, em 2008 e 2009,
respectivamente, também se baseia no conceito de sustentabilidade. A intenção é
reavivar os conhecimentos tradicionais e as experiências dos povos indígenas
como alternativa ao capitalismo ocidental, visto como uma herança colonialista,
responsável pela grande divisão social nos dois países.
No Buen Vivir, o foco não está em superar o
subdesenvolvimento por meio do progresso econômico, mas por meio do progresso
social. Este inclui a preservação da identidade cultural e das sabedorias
tradicionais, assim como o acesso à educação. Bem-estar não é definido pelo
crescimento material e consumo, mas pelo desenvolvimento em harmonia com a
natureza.
A realidade econômica e social nos dois países
ainda está longe desses objetivos, mas a filosofia do Buen Vivir deve ser vista
como um caminho para a transformação social. Um passo inicial foi a criação da
iniciativa Yasuní-ITT, que, em vez de incentivar a exploração das reservas de
petróleo do parque nacional Yasuní, no Equador, visa proteger a biodiversidade
da Amazônia e a população local. Em retorno, o país espera que a comunidade
internacional compense metade da renda perdida com a não-exploração dos
recursos naturais.
África: valorização da humanidade
O conceito de Buen Vivir está intrínsecamente
ligado às tradições indígenas dos dois países andinos e não pode ser
simplesmente aplicado em outras regiões. Mas a crença de que o homem é parte de
um todo e que respeito, solidariedade e dignidade humana devem ser a medida
para ações econômicas e políticas também integra o conceito Ubuntu, na África
do Sul. O nome vem de dois idiomas Bantu (Zulu e Xhosa) e significa humanidade.
Com outros nomes, o conceito também existe em outras partes do continente
africano.
Na África do Sul, após o fim do regime
segregacionista apartheid, o presidente Nelson Mandela colocou o Ubuntu no
centro da ação política: humanidade e senso de comunidade deveriam formar os
valores da nova nação que surgia. Com o tempo o conceito acabou sendo deixado
de lado, mas o Ubuntu Education Fund (Fundo Ubuntu para Educação) permanece
comprometido com os princípios que dão nome à organização, através do apoio a
projetos de saúde e educação.
Nelson
Mandela ao se tornar presidente da África do Sul tentou implantar a filosofia
Ubuntu
Felicidade como política nacional
Como uma antítese budista à busca ocidental do
lucro máximo, o rei do Butão formulou em 1972 a ideia de Felicidade Interna
Bruta (FIB), que deveria ser mais relevante do que a performance econômica do
país e se baseava em quatro pilares: proteção ao meio ambiente, preservação de
valores culturais, desenvolvimento econômico e social para toda a sociedade e
boa governança.
Ao implementar o seu FIB, o rei estabeleceu que
saúde e educação deveriam ser gratuitas e mais de 30% do orçamento nacional,
direcionado a gastos sociais. As florestas, que cobrem mais de 70% do
território do país, se tornaram áreas de preservação. Investimentos públicos e
novas propostas de legislação devem ser analisadas por um comitê especialmente
criado para essa função. Caso os projetos não estejam de acordo com o conceito
do FIB, eles devem ser debatidos no Parlamento e revistos.
O Centro de Estudos do Butão, que possui status de
ministério, realiza regularmente pesquisas sobre o índice de felicidade entre a
população. As perguntas são sobre renda, segurança no trabalho, acesso à
educação e à saúde, condições do meio ambiente, bem-estar psicológico e
disponibilidade de tempo. Ao menos 52% da população se considera
"feliz", 45% se diz "muito feliz" e apenas 3% afirma estar
"não muito feliz".
Indicadores globais de qualidade de vida
Os exemplos citados acima levam a crer que a
estabilidade e o bom funcionamento das estruturas sociais, o conhecimento da
própria identidade cultural, assim como a preservação do meio ambiente, são
fatores essenciais para uma qualidade de vida satisfatória. Esses conceitos
também têm em comum o fato de estarem fortemente enraizados nas tradições e
religiões dos seus respectivos países, o que limita as possibilidades de
exportá-los a outras nações.
Para tornar possível a comparação do bem-estar
social em diferentes países e culturas, a ONU desenvolveu o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH). Nos relatórios anuais publicados desde 1990, não
apenas a renda per capita é levada em conta, mas também a expectativa de vida e
o nível de educação. A análise da expectativa de vida permite avaliar a
situação dos sistemas de saúde, padrões de higiene e condições alimentares. O
fator educação reflete o padrão de vida e a participação dos indivíduos na
sociedade.
No topo da lista estão países ocidentais
industrializados que se ocupam das questões do bem-estar social, como a
Noruega, a Austrália e a Holanda. Os EUA estão na quarta posição, a Alemanha em
nono e o Brasil é o 84º. Os últimos 15 países dos 187 dos listados no IDH estão
na África subsaariana. O IDH da ONU é criticado por não levar em conta as
questões ambientais.
Felicidade, mas a que preço?
Existe também o Happy Planet Index (HPI), ou seja,
o índice de felicidade do planeta. A organização independente New Economics
Foundation criou há sete anos o primeiro ranking que, além da expectativa de
vida, analisa também a satisfação pessoal e a pegada ecológica das populações.
São pesquisados, entre outros pontos, quantos recursos naturais são consumidos
per capita para atingir o padrão de vida de um país.
No primeiro lugar no ranking de 2012 estava a Costa
Rica, seguida do Vietnã. O Brasil está em 32º, a Alemanha ocupa a 46ª posição e
os EUA ficaram em 105º lugar, bem atrás do Quirguistão (61º) e de Bangladesh
(31º). Concluir que os americanos são mais infelizes que os quirguizes e os
bengalis seria um exagero. o HPI apenas afirma que os americanos compram sua
felicidade através do consumo excessivo de recursos naturais.
Autora: Mirjam Gehrke (rc)
Revisão: Alexandre Schossler
Extraído de https://www.dw.com/pt-br/riqueza-n%C3%A3o-garante-qualidade-de-vida/a-16568082
Acesso em 21.jan.2021.